Os cronistas faziam seus textos diariamente ou semanalmente para um jornal que seria impresso. A tarefa de escrever, então, era um compromisso sério. Havia um prazo para terminar e enviar. Era o cruel dead line, como se usa na rotina do repórter de jornal, revista ou televisão. Além de concluir o texto, o cronista ainda tinha que enviar o texto para a redação.
Na época em que Clarice Lispector escrevia, não havia computador. Só máquinas de escrever. O texto tinha que ser escrito rotineiramente. Não dava para esperar inspiração. Tinha que trabalhar. Não havia tempo para sonhar. E olha que Clarice tinha um espaço aos sábados no Jornal do Brasil, do Rio de Janeiro. Escrever por obrigação foi um desafio e tanto. Porque ela se dizia amadora e não profissional. Se a gente for ver a definição de amadora, vai descobrir que é aquela pessoa que faz algo por amor. E não por dever. Nesse sentido, Clarice era uma adorável amadora. E todo cronista que se preze um dia vai explodir:
Amanheci em cólera. Não, não, o mundo não me agrada. A maioria das pessoas estão mortas e não sabem, ou estão vivas com charlatanismo.
E criaram o Dia dos Analfabetos. Só li a manchete, recusei-me a ler o texto do mundo, as manchetes já me deixam em cólera.
| Clarice Lispector. A Descoberta do Mundo, trecho de crônica publicada no Jornal do Brasil em 14 de outubro de 1967.